quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Ao Deus dará

Auto - abandono revelado pelo Carnaval
Desde a faculdade de jornalismo sempre ouvi profissionais experientes exaltarem a importância que a cobertura jornalística de um Carnaval tem para a carreira de qualquer repórter. Por isso, mesmo sem nunca ter sido muito entusiasmada com a festa de Momo, abracei a missão de cobrir o Carnaval de rua carioca com toda a paixão e profissionalismo. E, mais que uma tremenda oportunidade comercial para minha empresa, enxerguei no compromisso de fazer essa cobertura, uma ocasião perfeita para ter um batismo dito “fundamental” por jornalistas veteranos. Tudo começou quando, semanas antes do Carnaval, eu e minhas sócias comemorávamos o fechamento de um negócio importante que envolvia nossa empresa e mais outras duas, na prestação de um serviço para uma grande empresa patrocinadora dos blocos do Rio de Janeiro. A tarefa consistia numa pesada maratona atrás dos blocos cariocas, com a produção de textos jornalísticos e publicação (quase em tempo real) no site da empresa cliente, abrigado em um grande portal de informações, na internet.
Aparentemente, a missão parece simples. Mas, só parece mesmo, tento em vista que o Carnaval de rua carioca é feito por quase grandes blocos, que ostentam números como 50 mil seguidores, que, para completar, acontecem em diferentes bairros, muitas vezes em horários simultâneos.
Sim, foi imprescindível selecionar, orientar, acompanhar e coordenar o trabalho de uma equipe de reportagem para agregar força e agilidade ao trabalho que começou comigo e com uma das minhas sócias.
Quem lida com jornalismo sabe que coordenar uma equipe de reportagem não é moleza. Que dirá quando o “editor” também atua como repórter. Esforço dobrado, num plantão que começou dias antes do Carnaval e avançou feriado adentro. Basicamente, é isso que posso falar sobre o operacional da missão.
Mas há uma outra parte, a que diz respeito às minhas impressões como repórter, depois de acompanhar cada bloco. Entre tudo o que vi, saltou aos olhos a extrema criatividade e alegria do brasileiro (assim mesmo, de forma geral, já que o Carnaval carioca recebe turistas de todos os estados). Fantasias mirabolantes, simples ou inusitadas, não importa!Entre todas havia uma unanimidade: a criatividade e poder de transformar a dor em humor!Além, é claro de uma alegria genuína e muito intensa. Dessas de causar inveja aos rabugentos de plantão. Nesse sentido, duas cenas me marcaram. Uma delas foi ver um velinho de bengala dançar e cantar em seu quintal, acompanhando, como podia, o bloco que passava em sua rua. A, outra foi entrevistar Elza Soares, veterana de outros carnavais, e entender porque a estrela recebe, ano após ano, várias homenagens nesse período (era, inclusive, homenageada de um dos blocos). Apesar de já idosa, Elza irradia uma vontade de viver muito grande, que talvez, explique o fato dela se manter (de forma positiva) na mídia há tantos anos.
Dotado de tanta inteligência (faço essa leitura do bom humor e criatividade) e otimismo, chega a ser triste o fato do brasileiro ter um nível de interesse por assuntos de coletividade, como a política, por exemplo, inversamente proporcional ao Carnaval. Sempre fazia essa comparação quando via multidões de foliões, se deslocarem espremidas em ônibus lotados, de um bairro para o outro, para acompanharem seus blocos preferidos, com um calor de 40º, com todo o entusiasmo do mundo. No entanto, diante de eleições ou acontecimentos políticos importantes, nunca vi nem um terço dessa mobilização e interesse.
Por isso, digo sem medo, que o brasileiro parece viver numa fuga da realidade, marcada por uma miopia constante diante de seus próprios interesses. Como se a “providência divina” fosse a responsável por nos prover de tudo. Essa foi a impressão mais forte que eu tirei da cobertura do Carnaval de rua.Daí meu desapontamento com o tal batismo, de que sempre ouvi falar com um entusiasmo ímpar por profissionais da antiga. Das duas uma: ou me sobra pessimismo ou meus colegas e mestres são otimistas demais.

Nenhum comentário: